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A mostrar mensagens de agosto, 2009

Se Eu Soubesse Que Ias Morrer

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E a morrer de saudades, escreveu-lhe uma carta sabendo que ele jamais a iria ler: Meu querido, em breve fará um ano desde a tua morte. Se fosse apenas este ano. Como eu queria que fosse apenas este tempo que está a passar e prestes a chegar ao fim. Sinto-me frágil. A vida sem ti não tem sido fácil. Tudo me faz recordar-te, e as saudades alastram-se por todo o lado. No dia de todos os Santos, fui à tua campa levar-te um ramo de flores do campo, e um poema que tenho a certeza que deves ter lido vezes sem conta. Como eu queria ser capaz de te recordar sem os olhos cegos pelas lágrimas. Apenas continuo aqui entre os meus restos, a tentar enfrentar a realidade com a cabeça erguida. Sinto esta dor tão forte enterrada em mim. Que me rouba o apetite. Me tira a vontade de sair e de festejar o meu aniversário. É já para a semana, sei que me virás dar um beijo na testa enquanto estiver a dormir por volta das duas horas da manhã, a hora em que nasci. Passei alguns dias na aldeia, basicamente nem s

O Amor Avariou-se

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O amor, não mais que um privilégio. E a verdade é que nenhum privilégio é realmente merecido. Há que pagar mais tarde ou mais cedo. Entramos atraidos pelo paraiso, e mais tarde perdemo-nos lá para os lados do inferno. O que sobra de uma história de amor avariado? Palavras dispersas. O tempo de um amor que perdeu a continuidade. Um amor sem sabor e sem lembrança. Que habita uma cidade sem nome, numa casa cuja a rua tem um nome diferente de ontem. Foi vida e deixou de ser sem que ninguém ao certo percebesse como. Esse amor que se avaria, frágil como um fio de teia de aranha. Basta tão pouco, uma pequena corrente de ar para que tudo se mova. O amor de hoje está mais avariado do que nós próprios. Mas pode ser uma avaria simples. Basta um sorriso, que pode renascer. Sim porque até nos casos mais frágeis, se abre uma, duas ou três esperanças.

Amor Amargo

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Mal se conheceram inauguraram a palavra sentir. Apanharam as contas caídas que rolavam perdidas numa rua qualquer. Atiraram um sorriso de boca para boca. E o olhar desfocado viu nitido. Abriram a casa da verdade, modesta, o eterno abrigo. Partilharam vivências escrupulosas e quiseram fugir dos males do mundo. Juntos, não mais que a correcção do erro. Derrotaram a solidão num único olhar. Abraçaram sem saber uma tarefa fértil. E entraram numa grande festa. Perguntei se me amas amigo? O teu lábio foi lento a confessar-se. E essa doce pergunta minha, ajudou ao sim furtivo que levas-te contigo. Mas também, só querias partilhar a sede desta alegria, por mais amarga que ainda nos pareça.

Toda a Aproximação é um Conflito

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Fernando Pessoa já via há muito tempo atrás, a calamidade que pode ser uma aproximação. Ele dizia com uma lucidez invejável: "Cada um de nós é dois, e quando duas pessoas se encontram, se aproximam, se ligam, é raro que as quatro possam estar de acordo. Toda a aproximação é um conflito. O outro é sempre o obstáculo para quem procura. Só quem não procura é feliz. Porque só quem não busca, encontra, visto que quem não procura já tem, e já ter, seja o que for, é ser feliz, como não pensar é a parte melhor de ser rico. Olho para ti, dentro de mim, noiva suposta, e já nos desavimos antes de existires. O meu hábito de sonhar claro dá-me uma noção justa da realidade. Quem sonha de mais precisa de dar realidade ao sonho. Quem dá realidade ao sonho tem que dar ao sonho o equilíbrio da realidade. Quem dá ao sonho o equilíbrio da realidade, sofre da realidade de sonhar tanto como da realidade da vida e do irreal do sonho como do sentir a vida irreal. Estou-te esperando, em devaneio, no nosso

Sem Intervalo

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Não te assustes com o som da minha música. O violoncelo, até pode ser tão perfeitamente um adereço da minha nudez. Talvez a música tenha o calor da carne. Não temas que este corpo seja mais real que a madeira, as cordas e a vibração. Nunca me peças que faça um intervalo no tocar.

Não me peçam razões

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Como eu entendo tão bem as palavras de José Saramago: "Não me peçam razões, que não as tenho. Ou darei quantas queiram. Bem sabemos que razões são palavras e todas nascem da mansa hipocrisia que aprendemos. Não me peçam razões por que se entenda a força de maré que me enche o peito. Este estar mal no mundo e nesta lei. Não fiz a lei e o mundo não aceito. Não me peçam razões, ou que as desculpe. Deste modo de amar e destruir. Quando a noite é demais, é que amanhece a cor de primavera que há-de vir." Cada vez respeito mais as razões que a própria razão desconhece.

A Tempestade Faz Sentido

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A vida é semelhante a uma tempestade de areia que não pára de mudar de direcção. Muda-se de rumo, mas a tempestade de areia vem atrás de nós. Muda-se de direcção, e a tempestade teima em perseguir-nos, seguindo no nosso encalço. Isto acontece uma vez e outra e outra, como uma espécie de dança maldita. A tempestade não mais que nós próprios. Algo que se revolta aqui dentro. Há que nos deixar levar. Mergulhar na tempestade. Fechar os olhos e tapar os ouvidos para não deixar entrar a areia e, passo a passo, atravessá-la de uma ponta a outra. Aqui não há lugar para o sol nem para a lua. A orientação e a noção de tempo são coisas que não fazem sentido. Existe apenas areia branca e fina, como ossos pulverizados, a rodopiar em direcção ao céu. É é assim que se deve imaginar uma tempestade de areia. Não há maneira de escapar à violência da tempestade. E por mais metafísica e simbólica que seja, rasgar-te-á a carne como mil navalhas de barba. E quando a tempestade tiver passado, mal te lembrará