De Boca Aberta
Estou de boca aberta há sensivelmente cinco horas.
Aliás de há uns dias para cá.
E mesmo com ela toda aberta não consigo beber tanto.
Nem com palha, nem á força, nem com o biberon como se fazem às crias recém nascidas.
Mas a verdade é que não morro á sede.
Tenho a boca aberta, presa aos momentos que me chegam sem avisar.
Como uma foto que capta o instante exacto do que se vive naturalmente sem improviso.
Acho que me vais deixar de boca aberta todos os dias.
E eu no alto dos meus trinta e quatro anos, vi o que ainda não fui.
Virgem para a nova vida que desenhas em mim desde o instante em que nos cruzámos.
Sinto-me a viajar na vida que vivi, numa plataforma mais elevada.
Com vista panorâmica para o que não tem explicação.
E que eu não quero que tenha porque não tem.
Olho para mim e pergunto:
Reconheces-te?
Sim sou eu, mas de uma maneira tão estranha.
E quanto mais tempo corre mais estranho parece.
Como quem não busca nada, e o que vai encontrando fica coberto com um véu de ignorância.
Se há quem diga que há um Deus para nos salvar, eu já fui salva.
E eu a pensar, que talvez não merecesse tamanha recompensa por ser humana.
Deus ensinou-me a morrer para renascer, e aprender a valorizar o que a vida leva e o que nos pode oferecer.
Não me preparei para o inesperado.
Entrámos nisto sem querer e não saimos disto por querer, mas ficámos a saber por onde passámos.
Estou de boca aberta, não por momentos transitórios mas pelo que é definitivo.
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